sábado, 2 de abril de 2005

Sexta-feira, primeiro de abril.
Avenida Bias Fortes, esquina com Rua da Bahia.
14:45h, aproximadamente.


[Estranho] - Boa tarde! Tudo bem?
[Paulo] - Boa tarde...
[Estranho] - Desculpa estar incomodando você e sua namorada... Oi, boa tarde! Prazer, eu sou o Fabinho.
[Eu] - Oi, boa tarde...
[Estranho] - É o seguinte: eu e meu amigo aqui, a gente é da Pedreira, sabe? Acabou de acontecer um lance lá na casa dele. Maluco entrou lá e matou a mãe e o irmão dele e deu uma coronhada na cabeça dele, olha aqui. ("Fabinho" mostra o supercilho recém-cortado de seu companheiro) A gente tá indo lá na casa do cara matar o maluco, mano.
[Paulo e eu] - Ah, sim, claro...
[Estranho] - Não, não precisa ficar com medo, ninguém aqui vai matar vocês, ninguém vai assaltar vocês. (Sorriso írônico) Porque se eu quisesse matar vocês eu já tinha matado, não é não? Comigo não tem esse negócio não, mato aqui mesmo, em qualquer lugar, em qualquer hora. Se eu quiser matar eu mato mesmo.
[Paulo e eu] - Aham...
[Estranho] - Mas eu só tô pedindo 10 real pra vocês. Eu preciso chegar lá na casa do cara agora e preciso de 10 real. Vocês não têm dinheiro aí, não?
[Eu] - Não, não tenho nem um centavo, foi mal.
[Paulo] - Nem eu...
[Estranho] - Sei, sei... Mas é na humildade mesmo, mano, tô pedindo na humildade. Não quero tirar dinheiro da passagem de vocês não. Mas acabei de perguntar isso prum cara ali, o cara me fala que não tem dinheiro e eu vi que ele tinha dinheiro na capinha do celular. Aí não dá, né, mano, mentir não! Tô perguntando aqui na humildade mesmo, se eu quisesse matar e roubar vocês eu já tinha roubado. Eu tô armado, tá vendo, mano? ("Fabinho" pega no corpo de sua arma, que está enfiada na calça, por cima de sua blusa. Sim, ele está mesmo armado.) Na moral mesmo, vocês não têm dinheiro mesmo não? Porque o importante é sair vivo, não é mesmo?! (Sorriso irônico)
[Paulo] - Ah, eu tenho um real só, aqui...
[Eu] - Não, eu não tenho mesmo. (Eu estava com 5 reais no bolso)
[Estranho] - Pois é, mas é porque... Posso ver seu celular, mano? Já falei, é na moral mesmo, não quero saber de mentira não!
[Paulo] - Posso confiar?
[Estranho] - Pode, pode, claro...
[Paulo] (Mostra o celular) - Tá vendo? Não tem nada mesmo.
[Estranho] - Certo, certo... E você?
[Eu] - Eu não tenho.
[Estranho] - Não tem o que? Não tem capinha de celular ou não tem dinheiro?
[Eu] - Não tenho celular. Não trouxe. Só trouxe meu livro e meus materiais de escola, eu tenho aula agora. (Começo a me afastar dos estranhos)
[Estranho] - Pois é, mano, mas na moral mesmo... Vocês moram onde?
[Paulo] - Aqui em baixo...
[Eu] - No centro. (Por algum motivo eu não quis dizer que morava no Lourdes...)
[Estranho] - (Começa a repetir a mesma história...)
[Eu] - Tá, mas olha só, eu tô com um pouco de pressa, tenho aula agora... Boa sorte aí.
[Estranho] - Tá certo, mano, desculpa qualquer coisa aí, valeu? Tudo de bom pr'ocês.
(E ele continuou a subir a Bias Fortes e nós a descer...)

Agora me ocorreu uma coisa. O outro cara, o do supercilho-cortado recém-orfão de mãe, estava com uma sacola de papel na mão, que ele segurava com bastante firmeza. Eu imagino que aquilo também fosse uma arma...

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